2011/05/21

Munições que mataram segurança estavam em lotes que foram para o exército

A Polícia Judiciária chegou à conclusão que as munições que mataram Alberto Ferreira (Berto Maluco) eram de lotes militares. O exército falou em furto de material de guerra.
 
Dos 54 disparos, 19 atingiram o segurança Alberto Manuel dos Santos Ferreira, mais conhecido por Berto Maluco, na cabeça, no tronco e nos membros. A primeira rajada foi feita a dez metros e o golpe de misericórdia a cerca de um metro e meio da vítima.

Um assassinato que vai ficar por julgar, uma vez que a equipa especial do Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP), liderada por Helena Fazenda, não conseguiu reunir provas para acusar os responsáveis. Escreve-se no processo que os investigadores se depararam com uma "muralha de silêncio".

Todavia, dos quatro casos de homicídio em que foram vítimas Nuno Gaiato, Ilídio Correia, Aurélio Palha e Berto Maluco, apenas este último ficou, para já, sem culpados.

Destes crimes da noite portuense, talvez o mais elaborado tenha sido precisamente o do segurança Berto Maluco. Foram três rajadas de pistola-metralhadora, ao que tudo indica uma Uzi israelita - utilizada nas forças armadas portuguesas -, que o atingiram junto da sua casa em Vila Nova de Gaia no dia 9 de Dezembro de 2008 por volta das 11h30 da noite. Às 00h36 morreu no Hospital de S. João, no Porto.

Os investigadores da Polícia Judiciária (PJ) identificaram as munições de 9 mm como sendo fabricadas em Portugal e pertencendo aos lotes 84-02, 89-06, 90-03 e 90-08. O passo seguinte foi saber que unidade militar as distribuiu, a quem e em que datas. Segundo a investigação, os lotes 89-06 e 90-03 foram distribuídos, no seu todo ou em parte, ao exército português. Os militares responderam que as munições em causa foram gastas em cursos de promoção a cabo, a sargento e a oficial, mas foram incapazes de tirar a limpo o que aconteceu. Num dos ofícios das Forças Armadas, consultados pelo i, um alto responsável do Exército considera que pode estar em causa um crime de comércio ilícito de material de guerra ou um crime de furto de material de guerra.

A PJ chegou a um beco sem saída, uma vez que milhares de munições daqueles lotes eram vendidas para os três ramos das Forças Armadas e também a armeiros ou mesmo ao mercado externo.

A PJ pediu ainda aos militares o histórico de 19 pessoas, mas as respostas não ajudaram a investigação.

Pistas inconclusivas Outras pistas materiais consideradas neste caso foram uma ponta de cigarro encontrada no local onde o atirador se posicionou (um terreno junto à casa de Berto Maluco) e algumas fibras encontradas num arbusto. Tudo pistas inconclusivas.

Outra questão que não foi possível apurar foi a presença de um BMW de cor escura com uma letra X na matrícula, referido por várias testemunhas. Apesar do "levantamento de viaturas de marca BMW através do Sistema de Pesquisa da Polícia Judiciária, Conservatória de Registo Automóvel e Base de Dados da PSP", não resultou "qualquer elemento concreto relevante para a identificação".

Testemunhos Foram recolhidos inúmeros depoimentos de vizinhos e algumas testemunhas do crime, mas a única conclusão a que foi possível chegar foi que Berto Maluco foi alvo de disparos de, "pelo menos, três rajadas de arma de fogo automática".

Como refere o despacho de arquivamento do processo, a vítima estava relacionada com os processos da vaga de violência que ficou conhecida por Noites Brancas.

Berto Maluco era suspeito de ser um dos autores do homicídio de Nuno Gaiato, ocorrido em 13 de Julho de 2007, foi vítima de homicídio tentado na mesma ocorrência que resultou na morte de Aurélio Palha, ocorrida em 27 de Agosto de 2007, e "interveniente em agressões, confrontos físicos e ameaças, num cenário em que invariavelmente surgem no outro pólo do conflito indivíduos pertencentes ou conotados com o denominado Grupo da Ribeira, liderado por Bruno Pinto, também conhecido por Pidá".

Segundo a unidade especial do DCIAP, composta por procuradores, inspectores da PJ e elementos da PSP e da ASAE, houve quatro teses em cima da mesa: "conflitos com elementos do Grupo da Ribeira, conflitos com indivíduos associados à prática de segurança ilegal, conflitos com indivíduos relacionados com o tráfico de droga e conflitos com vítimas de extorsões ou de violência por parte de Alberto Ferreira".

A tese óbvia A PJ considerou que um dos factores importantes era o facto de Berto Maluco ser a única testemunha do homicídio de Aurélio Palha. A companheira de Berto Maluco referiu que Berto tinha identificado "o Sandro, o Pidá e o Mauro" como os autores dos disparos que vitimaram Aurélio Palha. Todavia, as localizações celulares e "uma análise aprofundada das comunicações efectuadas pelos números à data associados a esses indivíduos" não permitiram sustentar essa tese, que, para o DCIAP, seria a mais óbvia.
 
Ionline - Augusto Freitas de Sousa